ENTRE O MAR E A MATA

Em meio à encosta íngreme de Toque Toque Grande, no litoral norte de São Paulo, uma casa parece pousar silenciosamente sobre a Mata Atlântica, em um equilíbrio preciso entre técnica, paisagem e sensibilidade. Assinado pelo Studio Carlito e Renata Pascucci, o projeto de 150 m² nasce do encontro entre um casal apaixonado pela natureza e um terreno estreito, de apenas dez metros de largura, mas com uma vista cinematográfica que se estende do azul profundo do mar às montanhas da Serra do Mar.

Pensada como refúgio de fim de semana e também como casa para locação, a residência foi concebida para proporcionar uma experiência sensorial intensa e contínua. A arquitetura se abre integralmente para o horizonte, fazendo com que, de qualquer ambiente, o olhar seja conduzido pelas praias de Toque Toque Grande até Calhetas, com a Ilha Bela, o Montão de Trigo e, em dias claros, o arquipélago de Alcatrazes compondo um cenário quase onírico. A sensação é de navegação constante, como se a casa flutuasse entre o ar e o mar.

O partido arquitetônico organiza os espaços de forma clara e funcional. No pavimento térreo, sala de estar com lareira, cozinha integrada, lavabo, área de churrasqueira, deck e piscina se conectam sem barreiras, criando um ambiente contínuo e voltado à paisagem. No pavimento superior, uma única e generosa suíte se abre para o solarium, reforçando o caráter contemplativo do projeto. A casa é toda orientada para o pôr do sol e para a vista da Ilha de Toque Toque Grande, privilegiando luz natural, ventilação cruzada e conforto térmico.

Um dos grandes destaques do projeto é a piscina de borda infinita, suspensa a mais de 60 metros acima do nível do mar e estruturada por robustos pilotis. O espelho d’água parece dissolver os limites entre arquitetura e natureza, convidando o usuário a flanar entre as águas e o ar. O tom azulado da piscina se mistura ao mar, ampliando a sensação de imersão na paisagem.

Os desafios técnicos foram numerosos. O terreno em declive acentuado, as restrições de ocupação e os acessos difíceis exigiram soluções estruturais complexas. A opção pelo concreto aparente, associada a pilares e vigas metálicas galvanizadas a fogo, permitiu vencer grandes vãos, criar balanços estruturais e garantir leveza visual à construção. Durante a obra, que durou 15 meses, foram criadas passarelas provisórias e até um escorregador de quase 30 metros para transporte de materiais, revelando o caráter quase artesanal e experimental do processo construtivo.

A materialidade reforça a proposta de uma arquitetura contemporânea, honesta e integrada ao entorno. Concreto, metal, madeira, pedra e vidro convivem em harmonia, com destaque para o uso da madeira itaúba nos pisos e forros, a pedra natural na lareira e na churrasqueira, o brise de eucalipto tratado na fachada e os elementos metálicos vazados nas escadas e esquadrias. Uma única cor vermelha pontua o interior, aplicada na parede da escada e na marcenaria da cozinha, criando contraste e identidade.

Internamente, a casa revela a personalidade dos moradores em cada detalhe. O mobiliário e a marcenaria, em sua maioria desenhados pelo próprio Studio Carlito e Renata Pascucci, dialogam com peças icônicas do design brasileiro, obras de arte, objetos garimpados e referências afetivas. A decoração assume um tom livre e autoral, onde convivem escultura, arte popular, design modernista e elementos lúdicos, reforçando a ideia de um espaço vivido, sensorial e nada óbvio.

Mais do que uma casa de praia, o projeto se apresenta como uma experiência arquitetônica completa. Um lugar onde a natureza não é apenas cenário, mas parte essencial da vivência cotidiana. Suspensa entre o verde da mata e o azul do mar, a casa materializa o desejo de viver com menos excessos, mais contemplação e uma conexão profunda com a paisagem caiçara.